Não seria necessária mais nenhuma palavra um segundo antes ou depois de dizerem ao mesmo tempo: — Quero ficar com você...
Pequenso detalhes......
" E la em baixo....uma rede de anjos amparava nossa
queda... (Caio Fernando Abreu )
queda... (Caio Fernando Abreu )
segunda-feira, junho 30, 2014
Ih, ela escreve. Cilada, mano. Cai fora, dessa que é aí problema. Mulher que escreve é louca, detalhista, observadora e logo vai transformar você no protagonista de alguma das suas historietas. E aí você não vai saber se aquele silêncio é alguma frase sem predicado procurando nexo ou só sono mesmo. Ela vai querer viver aventuras, falar despropérios, enviar um texto gigante cheio de palavras que só flertaram com o dicionário até então e você não vai entender nada, enquanto ela acha tudo que ela conclui é que é livre e mãe da mais valiosa das opiniões.
Ela escreve, e de repente vocês acabam o relacionamento, param de sair, sem querer você dá um deslize, não sei; que seja. E então aquelas mãos de unhas pintadas em cores quase sempre tão vibrantes vão dedilhar impulsivamente alfinetadas em palavras já alinhavadas, toda a raiva acumulada num quartinho escuro agora em forma de texto agora com a porta aberta, a ferida exposta e latejante. Um recado que apenas você vai compreender mas, ainda assim, sentir uma vergonha proporcional a de estar pelado em plena Wall Street.
Como ela foi capaz? Ih, elas sempre são. Porque mulher, quando resolve que é capaz de ser escritora precisa decidir logo se consegue se desprender do pudor ou não. Viúva de culpas e com a cara tão à mostra já na espera de dedos apontados - e, por que não? - tapas da sociedade: quem é você pro tamanho dos halteres, anilhas e caneleiras da opinião de outrem que ela carrega nas costas mesmo?
O tamanho dessa enrascada, amigo, eu torço pra que você dimensione: é um perigo ficar muito junto desse anjo obscuro das redações, dessa criativa em tempo integral, catadora de problemas e existencialista de carteirinha.Como uma anti-heroína moderna, soma admiradores secretos e coloca medo nos mais fracotes e inseguros. Ela vai possuir legiões de seguidoras sempre muito atentas porque é voz de uma geração, sentir uma depressão quase pós parto depois de dar a luz a mais um de seus rascunhos então editados, fazer curiosas todas as outras em relação a que homem fenomenal é esse que faz bem tanto pra pele quanto pros escritos dessazinha?
A única roteirista do seu drama é a mesma dona da tendinite que acomete de tempos em tempos. Ela que escreve decide que capítulos merecem ser contados, as alterações a serem feitas e o destino de seus personagens. Corredora de uma maratona textual solitária, vence sozinha o seu medo das desventuras em que se enfia, o temor dos outros em se relacionar com uma doida dessas que enche gavetas com esboços e conhece a maioria dos sinônimos pra qualquer palavra desse mundo. Uma assassina de boas memórias, meu chapa, é isso que ela é.
E bem, caso tudo corra da melhor forma possível, talvez vocês se apaixonem e passem tardes de domingo juntos pra tentar salvar do tédio o pior dos dias. Essa moça vai construir castelos e fundar partidos, atravessar pontes e fugir contigo pra cidades longínquas: eternizar no papel mais uma história, desenhar a mão um pedestal para o seu ego, bendizer seus feitos, honrar suas qualidades. Vai ficar fácil parecer que o cetro está nas suas mãos e todos o acham o maioral: com você ela foi capaz começar um romance, o seu nome vai estar ali nas dedicatórias, será seu o primeiro dos autógrafos.....
Até a felicidade findar porque a candidata a Dorothy Parker já passou por boa parte disso antes. E o passado contém também detalhes do ex, em textos antigos. Os fantasmas existem e estar em contato com essa criatura que se concentra e digita vômitos existenciais, situações cotidianas e fantasias escabrosas é um pouco sinônimo de ter medo de se tornar só lençol, poeira e espírito.
É recomendável que o seu caráter aguente firme e aprecie cada linha do que ela registra: chamar para si o furacão de palavras atravessadas pode destruir sua imagem, ruir o santo que a própria colocou no altar com tanto louvor. Há que ser forte pra encarar as crises, as críticas familiares, a incompreensão de alguns íntimos que desconhecem de onde aquela enxurrada toda proverbial veio. Porque, no final das contas todas, na aritmética de quem tem (e precisa) o que dizer pra esse mundo, sendo do sexo feminino, sua única musa inspiradora é ela mesma.
Uma louca, uma deusa, quase uma feiticeira: ela é louca, louca demais. Cai fora, cara.
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